domingo, 26 de abril de 2015

Desce outra!


Preciso de um porre de amor ou de cachaça que me faça cambalear, pisar em falso, cair, errar o passo, mas que não deixe gosto amargo nem dê dor de cabeça.
Preciso de um porre de amor ou de cachaça que complique minha cabeça e bagunce o coração, mas que deixe a alma calma e os braços livres pra envolver num abraço o resto do mundo em que me acho.
Preciso de um porre de amor ou de cachaça que transcenda minha mente, que me faça soluçar e querer deitar entregue num colo acolhedor.
Preciso de um porre de amor ou de cachaça pra me perder por entre as ruas cantando alto os versos do Hélio sem me importar com olhares alheios, preu me largar por aí sem freio por ter encontrado em alguém ou no fundo do copo um combustível pra me queimar.
Preciso de um porre, apenas porre, porque no fim das contas amor e cachaça são sinônimos: a gente toma aos poucos e quando percebe tá entregue aos quatro ventos, indolor, entorpecido, desnorteado, subindo na mesa, falando merda com o coração na mão e um desejo enorme de que o momento não acabe. Mas acaba. E nenhum porre é igual ao outro. Viremos então a próxima dose! Garçom, reabre a comanda por favor que eu não tenho medo de ressaca.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Oração sem sujeito


  Abrir uma porta pra sair, fechar outras pra ninguém entrar. Limpar o quarto, fazer a cama, abrir a cortina, mudar o tom. Quantos verbos são precisos pra recomeçar? Quantos morrem na garganta por medo do efeito da causa? Morremos em verbos enquanto adjetivamos o coração.
  É tudo uma questão de gramática: usamos a sintaxe pra compreender a semântica, quando por vezes não há o que ser entendido. A semântica do ser é uma frase sinestésica e as metáforas que invento são desculpas pra não usar da sinceridade.
  Substituo o meu inteiro por uma fração indecifrável tentando justificar com metonímia o meu medo de uma nova entrega. É que em tempos de jogos ser objeto direto é perigoso, os outros preferem indiretas, preposições, obstáculos. Simplesmente não estou disposta a ler entrelinhas. Eu leio o abraço, os olhares e seus lábios quando estão junto aos meus. Leio a mão na cintura, a risada sincera depois da piada, o cheiro no cabelo que vai descendo pelo pescoço.
  A partir daí vou escrevendo mil histórias, nenhuma ainda com final, nenhuma ainda realmente feliz. Mas não paro de ler nunca,vou trocando de livro até que algum me faça passar da página dez, até que algum me renda horas de inspiração e frio na barriga, até que palavras doces escapem do meu punho e se estendam em beijos intermináveis.
  Pois bem! Decidi destrancar a alma e parar de engolir verbos. A quem interessar possa: entre sem bater, só traga cerveja, cigarro e sorrisos. Venha com bondade, não repara a bagunça! Me deixe com vontade. Pode deitar na cama, não precisa dizer que me ama, só precisa me querer de verdade, sem culpa, desculpas ou receio. Relaxa aí, te faço um café. Eu sou assim mesmo, tem medo não! Uma hora cê pega o jeito e eu largo a mesa pra comer na tua mão.