quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Agosto de quem?


Viajei por entre sons há muito esquecidos, voltei ao tempo onde minha sede de futuro era constante, eu só queria que o relógio disparasse ali dentro do meu quarto escuro no 3º andar pra que a minha vida finalmente acontecesse longe daquelas paredes que representavam as regras que minha mãe tanto citava todo santo dia, o dia todo. Minha mãe era daquelas que grudava bilhetinhos do tipo “não use drogas”, “use camisinha”, “amo você”, no meu guarda-roupa, que me pegava pelo braço, me deitava na cama do lado dela e mesmo vendo na minha cara que eu ficava puta com aquilo, iniciava aqueles papos de namoro, sexo e bebida que nenhum adolescente quer ter com os pais. E ficava lá horas antes de dormir me falando de tudo ruim que aconteceu com ela, pra eu tomar como exemplo, etc. Os planos dela pra mim não deram certo. Afinal de contas, nada como se jogar na vida pra receber os empurrões seguintes. E eu caí arduamente, e me levantei depressa, porque né? Eu tinha que correr atrás dos MEUS planos. Mas eles também não deram certo. Fui atropelada pelos meus pretenciosos quereres, e meu signo de ar não fincou o chão sob meus pés. Tatuei asas, elas me carregaram.  Voei. Fui longe, mais do que imaginei, mais do que previ. De repente, na seca típica de agosto em Brasília, o vento virou mormaço e caí. Me estrepei, meu caderno e apostilas se misturaram à poeira e meus sonhos foram levados pela  brisa que se fez depois do carro que passou por ali. Sentei na parada de ônibus logo adiante e fui embora com a boca seca e o coração na mão. Meu semblante era terno, mas por dentro eu gritava desesperadamente. Ninguém nunca sabe o que se passa aqui, já é normal nem procurar ajuda nessas horas, não consigo, simplesmente perco a fala, e dano a discorrer sobre banalidades com um sorriso estampado no rosto. Engulo meus problemas com a cerveja e os exponho com a fumaça do cigarro. E é assim que eu vivo e morro todo dia: entre um gole e uma tragada. Diálogo nunca foi uma coisa fácil na minha vida, vide a minha raiva com os papos da minha mãe, – detalhe que todas as minhas amigas achavam a atitude dela o máximo – também por isso quebrei a cara naquele agosto. Eu falo com a escrita, meu coração só se rasga no papel, não tem jeito. Aquele inverno fez-se inferno no meu mundo. Mudei de ares, mas o mormaço era o mesmo. Tentei passar 8 horas presa na torre, no 3º andar, num escritório gelado, na tentativa de refrescar meus ânimos, mas meu coração quase parou. Parti outra vez. E entre minhas idas e vindas, o nosso amor tava ali, meio torto, mas tava. Aquele amor passivo, esparramado pela casa, guardado em caixas do lado da cama, dentro das canecas de chopp roubadas dos barzinhos, dentro das sacolas de roupas espalhadas pela casa e enfeitado pelo cone da PM que eu roubei naquele dia de bebedeira. Mas era um amor tranquilo, mesmo com toda a movimentação ao redor, nos movíamos com o mundo, girávamos 24 horas em torno de nós mesmos e 365 dias em torno da vida que nos cercava. Um dia de cada vez, uma ressaca a cada fim de semana, mil beijos antes de dormir. Daí veio agosto novamente. Roubou a leveza dos nossos dias, jogou longe nossos sonhos, enterrou as expectativas de reencontro. Agosto sempre me roubando a vida de outros 11 meses, agosto sempre me desconsertando a alma, a cabeça e o coração. Setembro quando bate à porta me encontra aos prantos, descalça, maquiagem borrada, felicidade engarrafada, cinzeiro cheio e peito sangrando. Ofereço a outra face, pra ver se saio dessa fase. Bate que tá pouco, setembro, pisa com vontade e anestesia essa saudade, saudade de dezembro, janeiro, carnaval e quietude. Saudade dos 22 completos em maio e de todo o amor que você transbordou em mim na ocasião. Já sinto o 10º mês chegando, me cobrando a 2ª parcela da separação, que nem sei que dia vence. O meu pobre sentimentalismo só pergunta quando vence esse carnê das casas da vida, que espero pagar em dia. Mas calma, outubro, não me faça cobranças ainda, tenho planos pra você. Novos planos pra enterrar no barro vermelho de Brasília em agosto do ano que vem.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Pra facilitar o troco e a descida

Anestesia. Meu sentir foi privado e tô atendendo só aos extintos. Voltei a ser predadora, primata, rocha, antropofágica. Degluto as impressões externas do mundo e as devolvo em forma de soco. Minhas palavras cortam e ferem. É tudo somente sexo e amizade, como ouvi Bethânia cantar no repeat esses dias. Oito ou oitenta. O veneno corre nas veias e escorre pela boca depois de beijos desenfreados em outros sem importância. E já nem lembro o que restou, se restou. E já nem sei o que é me derreter, deleitar com carinho num obro nu em meio a lençóis bagunçados, perdoar também já nem sei. Não preciso de perdão por algo que não sinto, nem pedir nem conceder. Não preciso de doses de cuidado ao tocar em certos assuntos, preciso de porres pra saber o que falar e o que calar. Se bem que só calo na sobriedade, quando é necessário mentir pra quem caga regra na minha vida sobre os relatos das noites passadas. Estar só é uma tortura indolor, por isso minhas costas já não doem mais por conta do peso que é amar insanamente. Eu não sei o que fazer, mas faço; não sei o que pensar, mas reflito; não sei como me comportar e danço. Subo na mesa, tomo mais um gole, mais um trago no marlboro que você me ensinou a fumar, encontro alguém, beijo, mais um gole, mais uma dança, caio, ébria, louca, no descompasso, já não sei dançar, dou teu troco pelo coração apertado, pequeno, amedrontado que me foi largado aqui dentro. Pega o troco, toma uma cerveja com aquela pessoa das suas novas histórias, porque sede pra mim deixou de ser necessidade fisiológica e passou a ser estado psicológico. Você não tem condição de saciá-la, meus novos hábitos não são do nível dos teus trocados.